No templo de Asclépio

 

Robert Alan Thom, The temple and the cults of Asclepius. In: A History of Medicine in Pictures presented by Park, Davis and Co. , 1957.


    Segundo o poeta latino Ovídio (43 a.e.c – 18 e.c.), o nascimento de Asclépio, principal entidade divina controladora das doenças, marca o início da medicina grega. Segundo a mitologia, nasceu na Tessália, provavelmente no século VIII a. e. c., era filho do deus Apolo com a mortal Coronis. Durante sua gravidez, Coronis traiu Apolo com um mortal chamado Isquis, filho de Elates. Ao saber da deslealdade, o deus do sol tomado de ódio, feriu mortalmente a esposa, arrancando-lhe do ventre do filho ainda vivo. Asclépio recém-nascido foi levado por Apolo até Magnésia e foi confiado aos cuidados do centauro Quíron, profundo conhecedor de todas as plantas medicinais e responsável por instruir o semideus na arte de curar, tornando-o um exímio perito da prática médica, inclusive sendo capaz, conforme narra a mitologia, de ressuscitar os mortos. Hades, deus do mundo inferior e dos mortos, clamou a Zeus que tirasse a vida de Asclépio, pois este estava despovoando os seus domínios. Atendendo ao pedido de Hades, Zeus tirou a vida de Asclépio com um raio, em seguida, para abrandar a ira de Apolo, colocou-o no céu, transformando-o em uma estrela da constelação do Serpentário.

            Asclépio passou a ser representado como um ancião que viajava portando um bastão, no qual estava enrolada uma serpente – símbolo da adivinhação entre os gregos e auxiliar das divindades médicas. Foi associado a diversos outros animais como o cão, a cabra e o galo – que Sócrates, pouco antes de consumir a cicuta no diálogo platônico de Fédon dirigindo-se a Críton, promete em sacrifício a Asclépio -, este último simbolizando a vigilância no exercício da prática médica.

            Em toda a Hélade, foram construídos templos dedicados ao culto de Asclépio a partir do século VI a.e.c., localizados em lugares considerados saudáveis e aprazíveis, geralmente próximo ao mar ou lugares de grande beleza natural. Nas suas adjacências existia um bosque, considerado sagrado, no qual não se podia nem matar nem nascer, de modo a representar a vida eterna. No interior dos bosques, era comum a presença de fontes dedicadas à Ártemis e outras divindades ligadas à cura. No interior dos templos, existiam várias serpentes. O mais famoso deles situava-se em Epidauro, na Argólida às margens do mar Egeu.

            Enfermos se dirigiam a estes espaços procurando curas milagrosas para as adversidades que lhe assaltavam o corpo. O tratamento era constituído de práticas dietéticas, baseadas em jejuns rigorosos e alimentação leve à base de frutas, além de banhos. Os doentes eram untados em óleos, que eram lavados e purificados. Em seguida a essas práticas curativas, eram realizados sacrifícios – comumente de um galo. Os enfermos passavam a noite dormindo no templo, período chamado de “incubação”. Considerado um ato religioso, acreditava-se que esse momento provoca a aparição, em sonho, da própria divindade, para se obter saúde. Em alguns casos, o doente tinha visões que indicavam a natureza da doença e o modo de tratá-la, em outros o próprio deus, durante o sonho, curava o enfermo, mas nem sempre o deus atendia ao doente, seja porque este não merecesse ou por não ter feito a purificação de forma correta antes da incubação. Ocorria também a necessidade várias incubações antes da aparição em sonho de Asclépio.

Referências: 

MARTINS, Roberto de Andrade. Contágio: história da prevenção das doenças transmissíveis. São Paulo: Moderna, 1997.

MIRANDA, Carlos Alberto Cunha. A arte de curar nos tempos da colônia: limites e espaços da cura. 3 ed. Recife: Editora Universitária da UFPE, 2017.


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